A doutrina espírita nos fala que a fé pode e deve ser raciocinada. Mas de nada vale apreender todo o conhecimento se ele não nos servir para tocar o nosso coração e o coração de nossos irmãos. Um belo texto do André sobre isso.
ANDRE GERTSENCHTEIN
A publicação de “O Livro dos Espíritos”, de Kardec, em abril de 1857, mudou para semprea nossa relação com a religião. A nova doutrina não trouxe mais dogmas – ao contrário, adotou como um princípio fundamental o esclarecimento.
Segundo Kardec, “Fé inabalável é somente aquela que pode encarar a razão, face a face, em todas as épocas da humanidade”. Sua obra trouxe explicações para assuntos até então evitados no meio religioso. No Espiritismo, não existe assunto proibido – os limites estão mais em nossa capacidade de entender as respostas que na disposição dos espíritos em nos dar as explicações.
Aprendemos que fomos criados iguais, simples e ignorantes. Que, por meio de diversas experiências (encarnações), experimentamos o amadurecimento de nossos espíritos, ganhando, à medida que nos tornamos conscientes, também o livre arbítrio correspondente.
Que as escolhas que fizemos (e que continuamos a fazer) determinam a velocidade com que ocorre nossa evolução intelectual e moral.
E, finalmente, que o destino de todos, independente de quem sejam, é a perfeição. Na criação divina, ninguém é esquecido.
O Espiritismo ensina ainda que cada encarnação é precedidade planejamento criterioso, que envolve a escolha das experiências mais adequadas para nosso momento evolutivo. Esse mesmo planejamento permite o reencontro de pessoas a quem prejudicamos no passado e com as quais temos compromissos.
Apesar do planejamento, no entanto, muitos usam seu livre-arbítrio para cometer novos erros, o que poderá levar a novas expiações em encarnações vindouras, às vezes até mais duras.
Ensina que essas expiações, como, de resto, todas as coisas da Lei Divina, têm por objetivo a educação, e jamais a punição. É por isso que quando as expiações promovem as mudanças necessárias dentro de nós elas deixam de ser necessárias. E é por isso que não existe punição eterna.
Graves injustiças, assim entendidas sem o conceito da reencarnação, passam a ser melhor compreendidas e aceitas. Surge, em nós, a consciência da fragilidade das posições terrenas, pois aprendemos que os papeis se alternam: o poderoso de hoje poderá ser o humilde de amanhã.
O Espiritismo esclarece, e, ao esclarecer, nos consola. E isso não é pouco – mas também não é suficiente.
É que o esclarecimento é importante passo em nosso crescimento, mas sozinho, nada produz.
O que pretende a Doutrina Espírita é nos tornar melhores, promover nossa transformação moral. Para isso, é preciso levarmos o esclarecimento da cabeça para o coração. Deixar que a boa nova trazida pelo Espiritismo toque nossas almas, pois só assim daremos início à verdadeira transformação interior.
Pouco importará sabermos que alguém sofre “porque provavelmente expia erros de seu passado”, se não pudermos ter empatia pelo sofrimento dessa pessoa, e, assim, oferecer amparo e solidariedade.
Esse gesto (o da solidariedade) é a chave para que possamos dar início à nossa reforma íntima.
Abrir o coração para o sofrimento alheio nos faz melhores, e produz efeitos impressionantes em nossas almas. Além do aprendizado e transformação, traz paz e felicidade ao espírito, porque significa estarmos agindo em estrito acordo com a Lei Divina.
Vê-se, assim, que o Espiritismo não se propõe apenas a esclarecer: é preciso, para que possamos nos beneficiar realmente, que nos deixemos tocar por suas mensagens.
O esclarecimento é o caminho, mas não o fim.
Permitirmos que esse esclarecimento nos toque o coração, essa é a verdadeira essência da mensagem de Kardec.