INDIFERENÇA MORAL

Nesse artigo Glaucia nos fala do vício e da virtude que marcam a atual era da humanidade. Esclarece e também nos estimula a reverter a situação transformando o nosso progresso intelectual em ferramenta para nos aproximar de nossos irmãos.

Em uma passagem primorosa de O Evangelho Segundo o Espiritismo (ESE, Cap. IX, item 8), o espírito de Lázaro nos explica que todas as eras da humanidade são marcadas por uma virtude e um vício, que a tem que salvar ou perder. A virtude da nossa época é a atividade intelectual, enquanto o vício é a indiferença moral.

Ao refletirmos sobre essa passagem, concordamos imediatamente com a ideia de que a atividade intelectual é mesmo uma característica marcante do tempo em que vivemos. Não paramos de nos surpreender com os avanços exponenciais da tecnologia e já entramos nas discussões sobre a criação de inteligências artificiais.

Atribui-se à nossa geração a inauguração de uma nova fase de desenvolvimento humano. Fazemos parte de uma nova espécie, à qual se denominou por homus tecnologicus, na qual o pensamento consegue se ampliar para além do seu próprio cérebro, por ter incorporado recursos que aumentam a capacidade de raciocinar. Somos seres que incorporaram, com grande facilidade, novos gadgets que passaram a fazer parte de nós. Nos expandimos muito para fora de nós mesmos.

Em contrapartida, deixamos de mergulhar para dentro de um universo muito rico. Não exploramos o conhecimento de nós mesmos e, em razão dessa superficialidade, nos conhecemos mal e desconhecemos completamente os outros, que cada vez mais vão ficando distantes de nós.

No nosso encantamento pela tecnologia, incrivelmente, vamos nos isolando e nos distanciando das outras pessoas. Não precisamos mais lembrar nem dos telefones e aniversários dos amigos. E vamos nos acomodando, gostosamente, à vida ao toque dos dedos e aos comandos de voz. Tudo nos obedece e nos faz parecer mais poderosos do que nunca. Esse cenário alimenta o sentimento de indiferença por tudo que pode nos tirar da zona de conforto do nosso mundo virtualmente perfeito.

Quantas vezes nos isolamos deliberadamente das pessoas que precisam da nossa atenção real? Do parente doente? Do pedinte na rua? Do amigo que precisa de ajuda financeira? Da tia carente? Do colega desempregado?

Quantas vezes temos evitado as pessoas que estão com problemas porque elas, exatamente, estão com problemas?

Quando falamos em indiferença moral, logo nos vem à lembrança o exemplo de Pôncio Pilatos que, podendo salvar Jesus, lava as suas mãos e relega a decisão à turba enfurecida. Deu no que deu.

Hoje mesmo, li um artigo falando de escolas que passaram a ensinar as crianças a desenvolver a empatia, ou seja, a capacidade de compreender o outro, dentro da situação em que ele está vivendo.

Se tudo der certo, vamos ter uma geração com pessoas capazes de compreender as diferenças. Vamos ter seres humanos mais sensíveis, capazes de conviver, de forma natural, com pessoas de outra religião, de outras etnias, com outras orientações sexuais e com outros modos de vida.

Certamente, serão pessoas que não mostrarão indiferença ao ver alguém ser espancado por ser indígena, mulher, homossexual, copta ou muçulmano.

Certamente, não virarão o rosto, mas se voltarão na direção do outro para ajudar.

A solidariedade, como a tecnologia, também se desenvolve com a ponta dos dedos. Basta tocar o próximo. É fácil: é só estender a mão.

Glaucia Savin

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