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SEXUALIDADE E HOMOSSEXUALIDADE À LUZ DO LIVRO DOS ESPÍRITOS

Leonardo Mazzillo é advogado, espírita e resolveu falar nesse artigo, de forma bastante clara, sobre sexualidade e homossexualidade; tudo com fundamento nas lições de Kardec.  Vale a pena ler.

A sexualidade humana é um fenômeno impregnado de preconceitos que datam de séculos antes da vinda do Mestre Jesus ao planeta Terra, há pouco mais de dois mil anos. No Gênesis, primeiro livro da Bíblia Sagrada e da Torá, o ato sexual está associado à expulsão do ser humano do Jardim do Éden e à origem de todas as sua aflições. A adequada compreensão desse fenômeno, portanto, pressupõe o desvencilhamento de preconceitos milenares. Já a compreensão da homossexualidade, não diferentemente, encontra esses e outros entraves, especialmente por abranger uma minoria populacional e pelo fato de o ato sexual, nesse caso, não visar à reprodução.

Na literatura espírita, temos visto uma constante evolução a respeito da compreensão dos fenômenos relacionados ao sexo. No entanto, é comum nos depararmos com posicionamentos claramente conflitantes por parte de médiuns sérios e renomados a respeito desse tema.

E no caso presente, ainda que O Livro dos Espíritos (“L.E.”) pouco fale especificamente acerca da sexualidade e sequer mencione a homossexualidade, podemos encontrar um caminho seguro para a compreensão desses fenômenos com base nos princípios ditados pelos Espíritos.

De fato, quando se fala em sexualidade, a primeira pergunta a se fazer é se o sexo é um atributo do espírito ou se é um fenômeno da vida encarnada. A essa pergunta, o L.E. diz claramente nas questões 200 e 201 que a dualidade homem/mulher não existe nos espíritos, tratando-se de fenômeno da vida encarnada. Nos comentários à pergunta 202, Kardec afirma categoricamente que “Os Espíritos encarnam como homens ou como mulheres, porque não têm sexo”.

Mas se os Espíritos não tem sexo, o que definiria se cada espírito encarnará como homem ou como mulher? Seria questão de preferência? A resposta à pergunta 202 do L.E. evidencia que essa escolha nada tem a ver com desejo ou inclinação do espírito, consistindo em mais um elemento do planejamento encarnatório, para proporcionar o contexto mais adequado ao aprendizado. Portanto, “o que guia na escolha são as provas por que haja de passar”, dizem os mentores.

O próximo passo é analisar  para que serve o sexo: se apenas para reprodução ou se a sua função ultrapassa essa finalidade. Encontramos resposta a esse questionamento na compreensão da função dos desejos e prazeres humanos.

Sobre os desejos, a questão 907 do L.E. esclarece que o princípio originário das paixões ou desejos  “foi posto no homem para o bem, tanto que as paixões podem levá-lo à realização de grandes coisas”. Na pergunta 908, Kardec afirma textualmente em seus comentários que “as paixões são alavancas que decuplicam as forças do homem e o auxiliam na execução dos desígnios da Providência. No entanto, se em vez de controlar seus desejos e dar-lhes vazão de forma moderada e sem causar prejuízo a si ou a outrem, o ser humano passa a ser controlado por eles e incorre em abusos, os desejos assumem feição destrutiva e tornam-se seriamente perniciosos ao desenvolvimento espiritual, fazendo com que o espírito contraia, no mais das vezes, enormes dívidas a serem duramente saldadas na encarnação corrente ou nas posteriores.

Os Espíritos vão além ao atribuírem aos prazeres uma finalidade pedagógica, consistente em fazer com que os encarnados possam aprender a identificar a fronteira entre o moderado (e, portanto, benéfico) e o excessivo (que causa prejuízo a si ou a outrem).

 

Assim, se os desejos e prazeres, inclusive do sexo, tem função primordial na encarnação humana, decuplicando a força dos encarnados para que estes cumpram os desígnios da providência, claro está que o ato sexual tem função que vai muito além da reprodução.

Nesse contexto, sendo a homossexualidade – que se caracteriza pelo desejo e pelo prazer sexual por pessoa do mesmo sexo – uma manifestação da sexualidade humana, e considerando-se que inexiste motivo para que essas manifestações de desejo e prazer sejam consideradas negativas a priori, não há dúvida de que todas as conclusões a que chegamos acima, acerca de desejos e prazeres em geral, são perfeitamente aplicáveis à homossexualidade.

Não se pode dizer que o desejo e o prazer sexual oriundo do ato sexual praticado entre pessoas do mesmo sexo seja antinatural ou algo despido de função pelo simples fato de não se destinar a reprodução, porque, como dito, a importância do ato sexual ultrapassa em muito a perpetuação do ser humano como espécie.

A homossexualidade, evidentemente, consiste em mais um elemento do planejamento encarnatório que visa proporcionar o contexto mais adequado ao espírito para que ele aprenda as lições que lhe foram reservadas na vida encarnada, assim como acontece com a própria escolha do sexo.

Finalmente, na literatura espírita verifica-se que  alguns posicionamentos defendem o entendimento de que a homossexualidade consistiria num reflexo de perturbação espiritual ou numa expiação a priori. Essa noção é trazida subliminarmente, por exemplo, na tese de que a homossexualidade decorreria da circunstância de um espírito, após encarnar reiteradas vezes em um mesmo sexo, vir a encarnar no sexo oposto.

Entendemos que referidas teses são possivelmente impulsionadas pelo preconceito agora um pouco menos arraigado na sociedade, mas ainda suficiente para levar as pessoas a interpretações que contrariam os princípios do Kardecismo. Não há compatibilidade entre a Codificação afirmar, de um lado, a assexualidade dos espíritos, o sexo como elemento do processo de planejamento encarnatório e o próprio véu do esquecimento com a teoria de que a homossexualidade é uma perturbação ou uma inclinação decorrente de sucessivas encarnações no sexo oposto.

Em suma, a sexualidade em todas as suas facetas – inclusive a homossexualidade – se exercida de forma comedida e ética, no sentido da lei do amor, de que ninguém deve fazer ao próximo aquilo que não gostaria que lhe fizessem, é importante elemento da vida encarnada, compondo as alavancas que retiram o ser humano da indiferença e decuplicam-lhe as forças para o cumprimento dos desígnios da Providência. Por outro lado, a sexualidade exercida de forma abusiva e sem observar a lei do amor, pode ser extremamente prejudicial ao espírito, causando-lhe retardo no processo evolutivo e, possivelmente, acúmulo de novas dívidas para serem resgatadas na mesma ou em novas encarnações.

Leonardo Mazzillo

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